As novas descobertas sobre o Titanic
Às vésperas de completar 100 anos da maior tragédia do início do século XX, pesquisadores jogam luz sobre as possíveis causas do acidente - de problemas de fabricação até miragem
André Julião e João Loes
No domingo 8, vai ao ar o documentário “100 anos de Titanic por James Cameron”, às 20h30 no canal por assinatura, National Geographic. Confira, em vídeo, trechos do programa :
MONUMENTAL
Foram quatro anos de construção até a entrega do navio
Quando a linha de cruzeiros de luxo inglesa White Starline procurou o estaleiro irlandês Harland and Wolff, em 1908, para encomendar o maior, mais luxuoso e mais seguro transatlântico de todos os tempos, não havia nem espaço no canteiro de obras da empresa para acomodar os primeiros módulos do que viria a ser o Titanic. Quatro anos depois, porém, o esforço dos 15 mil funcionários do estaleiro tinha 46 mil toneladas, acomodava 2.435 passageiros, valia o equivalente, hoje, a US$ 171 milhões (R$ 311,7 milhões) e estava pronto para zarpar. O Titanic era, de fato, o maior, o mais luxuoso e o mais seguro navio de todos os tempos, uma verdadeira maravilha da engenharia, exatamente como a White Starline havia encomendado. A confiança era tanta que a embarcação foi anunciada a clientes em potencial como sendo impossível de afundar. Pois na noite do dia 14 de abril de 1912, durante a viagem inaugural, o transatlântico que colecionava superlativos afundou. E a ele foi atribuído um último superlativo: o de palco da maior tragédia humana do começo do século XX.
Hoje, 100 anos depois do acidente que tirou a vida de 1.523 pessoas, ainda se discute o naufrágio como se ele tivesse acontecido ontem. “Ainda nos importamos com o Titanic e nos importaremos daqui a 500 anos porque sua história diz muito sobre a condição humana”, diz o historiador e escritor inglês Tim Maltin, autor do livro “A Very Deceiving Night” (“Uma noite muito enganadora”, 2011, sem tradução para o português). Para ele, a ambição de construir um navio inafundável sintetiza o ingênuo desejo humano de controle absoluto diante das infinitas combinações de problemas que a realidade pode criar. “Pensamos que, nos precavendo, conseguimos antecipar tudo o que pode dar errado”, diz. “E o desastre do Titanic é uma prova de que nunca daremos conta de tudo.” As mais recentes pesquisas sobre a tragédia do transatlântico têm se debruçado sobre a série de coincidências e falhas que ocorreram naquela noite. Há uma série de fatores envolvidos – desde problemas estruturais do navio até alinhamentos celestes –, mas uma das maiores novidades seria um fenômeno ótico que impediu os vigias de verem o iceberg.
É o que propõem os estudos de Maltin após seis anos de pesquisa. Em parceria com um dos maiores estudiosos em miragens do mundo, o astrônomo Andrew Young, da Universidade de San Diego, nos Estados Unidos, o historiador inglês propôs que os vigias, na noite do naufrágio, não viram o iceberg a tempo de manobrar o navio por causa de um fenômeno óptico causado pelo clima do Atlântico Norte. Chamado de super-refração, ele acontece quando o ar está extremamente frio, dobra a luz emitida por objetos na linha-d’água para baixo. Dessa forma, a certa distância, o horizonte verdadeiro fica encoberto por uma névoa escurecida que se parece muito com águas calmas no escuro. Segundo Maltin, no caso do Titanic, essa névoa encobriu o iceberg, impedindo que os vigias o vissem a tempo de evitar a colisão. “As águas por onde o Titanic navegou naquela noite, apesar de muito calmas, funcionaram como uma espécie de zona de abate da natureza”, afirma o historiador. “As diferenças de pressão, temperatura e opacidade do ar se juntaram para enganar uma das tripulações mais experientes da época.”
Para chegar a essa conclusão, Maltin recuperou os diários de bordo de dezenas de navios que navegaram pelas mesmas águas que o Titanic singrou naquela noite. Na documentação, o historiador diz ter percebido que muitas dos relatos coincidem com o fenômeno da super-refração. Fala-se, inclusive, que o SS Californian, o navio mais próximo do Titanic, não teria respondido aos pedidos de ajuda do transatlântico irlandês por causa da super-refração. A ilusão de óptica teria desviado os raios de luz dos refletores usados por ambas as embarcações, que tentaram se comunicar por código morse visual, já que o rádio não funcionou bem naquela noite.
Outros estudos contemporâneos têm jogado luz sobre novos agentes que podem ter contribuído para o naufrágio. Rebites mal colocados, operadores de rádio desatentos, marés altas, alinhamentos celestes, variações climáticas e até chaves esquecidas estão entre os novos suspeitos (leia quadro na pág. 63). Nenhum, porém, explica sozinho a tragédia que começou na noite do dia 14 de abril e foi terminar na madrugada do dia 15, com o maior transatlântico do mundo repousando em duas partes a quatro mil metros de profundidade. “Temos 250 horas de filmagens em alta definição feitas por submarinos e robôs”, conta o oceanógrafo e arqueólogo Bob Ballard, o primeiro a descobrir os restos do navio, em 1985. “E sempre que descemos até lá encontramos novidades, principalmente nas partes internas do navio, onde os objetos estão mais bem preservados.”
Ainda há muito o que explorar e aprender nos locais onde hoje repousam a proa e a popa do Titanic. O problema é que, embora o espaço ocupado pelos restos do navio seja tratado pelos especialistas como sítio arqueológico, oficialmente não há legislação para proteger os 38,4 quilômetros quadrados de lodo ocupados pelo que sobrou da maravilha dos mares. Assim, louças, roupas e até partes da estrutura do transatlântico vêm sendo sistematicamente roubadas por turistas e saqueadores de relíquias que visitam o local e alimentam direta ou indiretamente o milionário mercado de leilões desse tipo de objeto (leia à esq.), enquanto outros tantos rumam para as estantes de quem desembolsou os US$ 60 mil (R$ 109,4 mil) cobrados para visitar a tragédia. “Comparei as fotos que fiz do naufrágio em 1985 com as que tirei em outra expedição, em 2004”, conta Ballard. “As maiores mudanças foram as causadas por submarinos que estiveram lá depois de 1985”, diz. Interromper a violação do sítio é permitir que os restos do Titanic continuem revolvendo perguntas e, às vezes, até fornecendo respostas às novas gerações.
Hoje, 100 anos depois do acidente que tirou a vida de 1.523 pessoas, ainda se discute o naufrágio como se ele tivesse acontecido ontem. “Ainda nos importamos com o Titanic e nos importaremos daqui a 500 anos porque sua história diz muito sobre a condição humana”, diz o historiador e escritor inglês Tim Maltin, autor do livro “A Very Deceiving Night” (“Uma noite muito enganadora”, 2011, sem tradução para o português). Para ele, a ambição de construir um navio inafundável sintetiza o ingênuo desejo humano de controle absoluto diante das infinitas combinações de problemas que a realidade pode criar. “Pensamos que, nos precavendo, conseguimos antecipar tudo o que pode dar errado”, diz. “E o desastre do Titanic é uma prova de que nunca daremos conta de tudo.” As mais recentes pesquisas sobre a tragédia do transatlântico têm se debruçado sobre a série de coincidências e falhas que ocorreram naquela noite. Há uma série de fatores envolvidos – desde problemas estruturais do navio até alinhamentos celestes –, mas uma das maiores novidades seria um fenômeno ótico que impediu os vigias de verem o iceberg.
É o que propõem os estudos de Maltin após seis anos de pesquisa. Em parceria com um dos maiores estudiosos em miragens do mundo, o astrônomo Andrew Young, da Universidade de San Diego, nos Estados Unidos, o historiador inglês propôs que os vigias, na noite do naufrágio, não viram o iceberg a tempo de manobrar o navio por causa de um fenômeno óptico causado pelo clima do Atlântico Norte. Chamado de super-refração, ele acontece quando o ar está extremamente frio, dobra a luz emitida por objetos na linha-d’água para baixo. Dessa forma, a certa distância, o horizonte verdadeiro fica encoberto por uma névoa escurecida que se parece muito com águas calmas no escuro. Segundo Maltin, no caso do Titanic, essa névoa encobriu o iceberg, impedindo que os vigias o vissem a tempo de evitar a colisão. “As águas por onde o Titanic navegou naquela noite, apesar de muito calmas, funcionaram como uma espécie de zona de abate da natureza”, afirma o historiador. “As diferenças de pressão, temperatura e opacidade do ar se juntaram para enganar uma das tripulações mais experientes da época.”
Para chegar a essa conclusão, Maltin recuperou os diários de bordo de dezenas de navios que navegaram pelas mesmas águas que o Titanic singrou naquela noite. Na documentação, o historiador diz ter percebido que muitas dos relatos coincidem com o fenômeno da super-refração. Fala-se, inclusive, que o SS Californian, o navio mais próximo do Titanic, não teria respondido aos pedidos de ajuda do transatlântico irlandês por causa da super-refração. A ilusão de óptica teria desviado os raios de luz dos refletores usados por ambas as embarcações, que tentaram se comunicar por código morse visual, já que o rádio não funcionou bem naquela noite.
Outros estudos contemporâneos têm jogado luz sobre novos agentes que podem ter contribuído para o naufrágio. Rebites mal colocados, operadores de rádio desatentos, marés altas, alinhamentos celestes, variações climáticas e até chaves esquecidas estão entre os novos suspeitos (leia quadro na pág. 63). Nenhum, porém, explica sozinho a tragédia que começou na noite do dia 14 de abril e foi terminar na madrugada do dia 15, com o maior transatlântico do mundo repousando em duas partes a quatro mil metros de profundidade. “Temos 250 horas de filmagens em alta definição feitas por submarinos e robôs”, conta o oceanógrafo e arqueólogo Bob Ballard, o primeiro a descobrir os restos do navio, em 1985. “E sempre que descemos até lá encontramos novidades, principalmente nas partes internas do navio, onde os objetos estão mais bem preservados.”
Ainda há muito o que explorar e aprender nos locais onde hoje repousam a proa e a popa do Titanic. O problema é que, embora o espaço ocupado pelos restos do navio seja tratado pelos especialistas como sítio arqueológico, oficialmente não há legislação para proteger os 38,4 quilômetros quadrados de lodo ocupados pelo que sobrou da maravilha dos mares. Assim, louças, roupas e até partes da estrutura do transatlântico vêm sendo sistematicamente roubadas por turistas e saqueadores de relíquias que visitam o local e alimentam direta ou indiretamente o milionário mercado de leilões desse tipo de objeto (leia à esq.), enquanto outros tantos rumam para as estantes de quem desembolsou os US$ 60 mil (R$ 109,4 mil) cobrados para visitar a tragédia. “Comparei as fotos que fiz do naufrágio em 1985 com as que tirei em outra expedição, em 2004”, conta Ballard. “As maiores mudanças foram as causadas por submarinos que estiveram lá depois de 1985”, diz. Interromper a violação do sítio é permitir que os restos do Titanic continuem revolvendo perguntas e, às vezes, até fornecendo respostas às novas gerações.